G. K. Chesterton, Tomismo e Certeza, por Alisson Milbank

 


  • O artigo seguinte, escrito por Alisson Milbank, foi publicado na edição de 23 de agosto de 2013 da ilussidiario.net. O “Chesterton Institute” foi um co-patrocínio a exibição de Chesterton para a Rimini Meeting 2013.

É fácil retratar Chesterton como tão positivo e convicto escritor, com um otimismo fácil e igualmente uma fé ortodoxa fácil, mas a verdade é muito diferente. Sua conversão inicial ao Cristianismo veio após um período de um tipo de inferno cético1 e, como Borges2 demonstrou, sua escrita sempre chacoalha à beira do pesadelo3. A atração de Chesterton por Aquino, eu argumentaria, é devido ao fato de que a estrutura de cada uma das questões da Suma Teológica põe, similarmente, toda a certeza em questão, com o ceticismo em objeção a toda asserção positiva – tal como “Deus existe?” -, que põe tudo em dúvida, até que Tomás se mova a fim de restabelecer a certeza numa base razoável. Dionísio, o Areopagita, foi uma forte influência em Tomás, e sua mística via negative  procede num caminho similar, com a asserção positiva sobre os negados nomes divinos, mas isso para ir a um profundo entendimento dos significados desses nomes. 

Chesterton escreveu um breve porém brilhante livro, originalmente intitulado Tomás de Aquino, o Boi Mudo ., em 1933. Ele localizou o núcleo da Filosofia de Tomás no que é frequentemente chamado “a instituição do ser”, pelo qual uma criança olhando para fora de uma janela sabe que vê algo: que há um “Ser”. Existência existe e, sem isso, não pode haver certeza sobre qualquer coisa, assim não há entre mente e realidade. Desse ponto de vista Chesterton segue a mostrar como Tomás argumenta para um mundo contingente e criado da variedade e potencialidade, e de lá ele alcança a necessidade para o próprio Deus, como a completa realidade a fim de que nossa incompletude a testemunhe. 

É porque há um “Ser” fora da nossa própria mente, seja grama ou Deus, que a realidade pode nos desafiar em sua alteridade, e permitir a mente a se mover para além de si mesma, a fim de experienciar comunhão com o objeto. Tem que haver algo do lado de fora para que haja algo com o qual (a mente) se una. Certeza vem, portanto, desse encontro místico com a palavra além do self (o eu), então isso é um presente, não uma posse. Vida, Chesterton escreveu em Ortodoxia, tem a qualidade de algo salvo de um naufrágio. 

É frequentemente dito que pessoas leem ficção de detetive para ganhar um senso de certeza: que tudo está certo com o mundo, com a moral e ordem – eventualmente – mantém o controle. As histórias do Padre Brown de Chesterton, contudo, colocam o leitor através da mesma noite escura de dúvidas como os artigos da Suma. Começamos com uma situação, que parece impossível, que força a questão. Então nós estamos em dúvida, enquanto a variedade de respostas são apresentadas pelos personagens da história. Finalmente, como Tomás com seu “Eu digo que…”, nós temos a resolução do Padre Brown para o problema, que responde a todas as objeções. 

Em “O Homem Invisível”, um homem desaparece de um prédio sob vigilância e seu assassino deixa uma trilha de pegadas, só que (nela) ninguém vem ou vai. A situação nos deixa numa total noite escura de dúvidas e incertezas. Que tipo de mundo poderia produzir uma situação tão impossível? Como de costume nas histórias do Padre Brown, são os materialistas que perdem a razão e procuram por uma explicação sobrenatural, isso leva o padre a procurar uma resposta prosaica e ele dá a explicação de um carteiro. Com seu saco de cartas, ele é tão ordinário e desconsiderado que ele é verdadeiramente invisível e não contado como uma pessoa pelos sentinelas vigilantes. 

O efeito dessa história não é nos esvaziar uma vez que sabemos a solução do mistério, o peso do mistério, a aura da suspensão de uma certeza não vai embora. Ao invés disso, nós olhamos para um homem ou mulher que traz nossas cartas e pacotes de uma nova maneira. O mundo é mais – e não menos – maravilhoso e miraculoso do que antes. Nós temos certeza, mas isso vem com a inexaurível profundidade que abre o conhecimento e não fecha a exploração, como o fundamentalismo moderno. 


1- Referência a um episódio narrado por Chesterton no capítulo 34 do livro Tremendas Trivialidades, O Diabolista. (http://www.gkc.org.uk/gkc/books/diabolist.html)

2 – Jorge Francisco Isidoro Luis Borges Acevedo foi um contista, ensaísta, poeta e tradutor argentino, figura-chave na literatura de língua espanhola e internacional. Grande admirador dos escritos de Chesterton.

3 – Chesterton nunca escondeu seu apreço por contos de ficção e terror, para propor um mistério. Em muitos de seus escritos ele faz um jogo de palavras com “nightmare”, que significa pesadelo mas que, numa tradução literal, seria “égua da noite”. A ideia é que ele está montado num cavalo sob o pesadelo, ele se diverte porque ele está no controle, não o pesadelo sob o controle de sua mente. Em Alarmes e Digressões, no capítulo 2 intitulado O Pesadelo, Chesterton diz: “o terror deve ser fundamentalmente frívolo. A sanidade pode brincar com a insanidade, mas não se deve permitir que a insanidade brinque com a sanidade”. Padre Brown é o cavalo que nos mantém seguro em histórias de crimes e assassinatos, aquilo nos choca, mas ele nos mantém seguros.

Traduzido por André Garcia.


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