O Chimpanzé Ayumu e o pastor da Chesterton Brasil

 

G. K. Chhesterton
G. K. Chesterton

Alguns sabem, mas muitos outros não devem saber, que há um pastor metido a influenciador de internet e exímio conhecedor do catolicismo, que vivia usando uma página sobre Chesterton no Instagram, cujo usuário é @chestertonbrasil, para espalhar coisas anticatólicas.

Diversas pessoas o denunciaram, dentre as quais Gabriel LaTorre, e até mesmo Carlos Nougué, que lhe ofereceu um curso de forma gratuita sobre Nossa Senhora, tendo em vista se não a conversão, ao menos uma melhor compreensão do catolicismo, mas a única coisa que obteve foi uma publicação do referido curso na plataforma TikTok em que o pastor faz apenas chacotas. O sujeito chegou a usar um livro de Newman chamado Tratado 90, escrito no ano de 1841, quando o mesmo ainda não era católico, para justificar que nós, católicos, somos salvos somente pela fé. Mas o que o pastor parece desconsiderar é que o próprio Newman, já convertido ao catolicismo, evento ocorrido no ano de 1845, o desmente dizendo que

A Via Media era uma ideia impossível.[1]

E quando acontecia de alguma de suas mentiras, enganos ou mal entendimentos serem desmascarados ou esclarecidos, ele começava a bradar aos quatro ventos que, em seu casamento, tinha citado de cabeça alguns trechos do catecismo de São Pio X. Vejam só vocês a sapiência do sujeito! Mas, se o tal pastor é tão conhecedor do catecismo, por que não lembrou destes pontos:

173) E quem, sendo um membro da Igreja Católica, não pusesse em prática os seus ensinamentos, salvar-se-ia?

Quem, mesmo sendo um membro da Igreja Católica, não pusesse em prática os seus ensinamentos, seria membro morto, e portanto não se salvaria, porque para a salvação de um adulto requer-se não só o Batismo e a fé, mas também as obras em conformidade com a fé.

863) É suficiente, para o cristão se salvar, as virtudes teologais recebidas no Batismo?

Para quem tem o uso da razão, não é suficiente ter recebido no Batismo as virtudes teologais; mas é necessário fazer frequentemente atos destas virtudes.

Se ele realmente soubesse algo de catolicismo, ainda que discordasse, não veria problema em dizer que para nós, católicos, a justificação é a passagem do estado de pecado para o estado de graça, sendo necessário para tal, inicialmente, a fé e o batismo, para assim fazer obras agraciadas, tudo em vista dos méritos de Cristo. Mas ele não sabe.

O que me faz lembrar de uma notícia publicada um tempo atrás, de um chimpanzé chamado Ayumu, que sendo treinado, conseguiu desenvolver uma capacidade incrível de memorização de números. Talvez o pastor devesse ter aulas de memorização com o chimpanzé Ayumu, ou ser adestrado da mesma forma que ele foi, com direito a cachos de banana e tudo mais. Quem sabe ele aprendesse a decorar os números 173 e 863 do catecismo de São Pio X.

Se esse é o protestante que estuda e conhece o catecismo e o catolicismo, imaginem o que não conhece nem estuda.

1 ponto para o chimpanzé Ayumu, 0 para o pastor da Chesterton Brasil.

Contudo, convém lembrar de uma outra coisa. Ainda que Newman tivesse permanecido com uma ideia errada, contrária à Fé Católica, nada mudaria. Ele seria apenas alguém que errou a respeito da fé. Poderíamos discutir a natureza do erro, pois como afirma Karl Adam,

Quando não se trata mais de luta de idéias contra idéias, mas, sim, de homens de carne e osso, quando se trata de apreciar estes ou aqueles não-católicos, o teólogo cede o lugar ao psicólogo, o homem do dogma ao homem das almas. Observa então que o homem, em sua vida real, não é senão raramente a expressão viva e completa de uma idéia, que o conjunto de suas idéias e de sua vida moral é por demais rico e complexo para que se o possa traduzir numa fórmula. Em outros termos: herege, o judeu, o pagão puros não existem. Há somente homens de carne e osso cuja atitude fundamental é influenciada ou dominada por idéias errôneas. Por isto, a Igreja distingue expressamente entre hereges "formais" e hereges "materiais", segundo rejeitam a Igreja e seu dogma explicitamente e em plena conciência, ou apenas por falta de suficiente conhecimento, originado, quer de prejuízos, quer de uma educação hostil à Igreja.[2]

Mas se Newman ou qualquer outro católico errou ou disse algo contrário à Fé, o catolicismo permanece intacto, e o erro não pode ser tomado como a mais ortodoxa doutrina católica. Isto é claro e patente.

Dizem que quando a mãe de João Calvino, um dos grandes Reformadores, estava para morrer, ela, que havia apostatado de sua fé católica para aderir à inovação do filho, perguntou-lhe se era melhor morrer como católica ou como calvinista, ao que ele responde que é melhor morrer como católica. Não sei afirmar a veracidade deste ocorrido, mas mesmo que não seja verdadeiro, é verossímil, já que o desespero da mãe e do filho diante do destino eterno da alma parece se abater sobre o nosso pastor, que tenta de todo modo pertencer à Igreja.


É verdade que os sacramentos agem ex opere operato, isto é, não agem em função da santidade da pessoa, de sua disposição ou qualquer esforço pessoal, mas pela objetividade mesma dos requisitos do sacramento, em outras palavras, matéria e forma na intenção de fazer aquilo que a Igreja sempre fez. Com efeito, há batismos válidos fora da Igreja Católica, quando se cumpre os requisitos aqui elencados, mas sempre incorrem em dois problemas. O primeiro é de que, por não haver a certeza da validade do batismo, quando alguém de fora da Igreja se converte, ele passa por um batismo sob condição, onde se diz: “(...) se ainda não és batizado, eu te batizo…” Foi o que aconteceu com nosso Gilbert Keith Chesterton e Newman, e  com toda pessoa batizada em alguma igreja que acredita em Cristo, mas que não é Católica. O segundo problema é o da frutuosidade da sacramento, já que

a filiação ao cisma, ou à heresia, é em si um impedimento à Graça. Isso implica que uma realidade sagrada, mesmo santa em si mesma, não pode ser um “elemento de santificação” enquanto está numa comunidade separada da Igreja. Esta comunidade é, em si, um impedimento à eficácia santificadora do elemento que roubou. Os sacramentos dados fora da Igreja apenas podem ser frutuosos nos casos em que a pessoa que os recebe não adere, formalmente, à heresia ou ao cisma. (É o caso, por exemplo, das crianças que não têm ainda o uso da razão; ou de pessoas que estão no que se chama “ignorância invencível”). Nesses casos, mesmo se o sacramento for materialmente recebido em uma comunidade separada da Igreja, a pessoa só o recebe de modo frutuoso porque escapa por sua intenção (in voto) a esta comunidade.[3]

        O mesmo nos recorda Karl Adam:

Inútil querer ajeitar as coisas: sobre a questão de saber se às outras comunidades cristãs uma missão de salvação foi confiada, se pode alguém salvar-se nas outras Igrejas cristãs, a Igreja católica é absolutamente intransigente. Precisamente porque todas essas comunidades se fundaram quebrando a unidade dos irmãos na fé e na caridade, são, do ponto de vista católico, instituições que não trazem o espírito do Cristo e, pois, puramente humanas e mesmo anticristãs. Com relação às mesmas, a Igreja só pode pronunciar o anátema. E este anátema, não poderá retirá-lo até que o Senhor retorne[4].

É preciso, aliás, não entendermos com isso — e aqui chegamos à terceira observação relativa ao adágio: "Fora da lgreja não há salvação"— que os sacramentos distribuídos fora da Igreja só tenham valor puramente objetivo, sem operar subjetivamente e sem produzir a graça no que os recebe. Tal era, ao que parece, o pensamento de santo Agostinho. Segundo ele, a graça, produzida objetivamente pelos sacramentos conferidos fora da Igreja, não poderia agir interiormente nos hereges ou cismáticos por estarem todos de má fé e obstinada e conscientemente se oporem ao espírito de unidade e, pois, ao Espírito Santo. Prevalecendo-se de santo Agostinho, sustentaram os Jansenistas o mesmo erro e afirmavam que "fora da Igreja não há graça" (extra ecclesiam nulla conceditur gratia). Foi ainda Roma que, pelo Papa Clemente XI, em 1713, expressamente condenou esta proposição.[5]

        E como nos lembra bem o Catecismo de São Pio X na questão 170 – aqui eis mais um número para o chimpanzé Ayumu e para o pastor decorarem – com muita clareza e objetividade, não deixando espaço para ambiguidade:

170) Pode alguém salvar-se fora da Igreja Católica, Apostólica, Romana?

Não. Fora da Igreja Católica, Apostólica, Romana, ninguém pode salvar-se, como ninguém pôde salvar-se do dilúvio fora da arca de Noé, que era uma figura desta Igreja.

        E com uma explicação mais extensa, mas sem perder a simplicidade e objetividade, Padre Gaudron nos explica:


O ensinamento da Igreja é muito simples: para ser salvo, é preciso pertencer à Igreja, seja in re (em realidade, isto é, preenchendo as três clássicas condições: Batismo, católica, submissão à hierarquia); seja in voto (por um desejo, explícito ou implícito). Por conseguinte, aqueles que não têm a Fé Católica ou que não estão submetidos à hierarquia, e que, além disso, não possuem nenhum desejo, nem mesmo implícito, de mudar de estado, não pertencem de nenhum modo à Igreja. Não podem assegurar sua salvação nestas disposições.[6]

A clareza é ímpar. Mas façamos nossas apostas. Quem irá decorar primeiro os números aqui colocados? O chimpanzé Ayumu ou o pastor da Chesterton Brasil? Dependendo do resultado, podemos solicitar aos nossos governantes que criem um projeto de lei para manter as coisas como estão ou se soltam os chimpanzés e prendem os pastores em jaulas.

Texto escrito por William Christopher.


[1] NEWMAN, John Henry. Apologia pro Vita Sua. Kelly And Co., Gate Street, Lincoln's Inn Fields, And Kingston-On-Thames (LONDON: 1890), p. 149.

[2] ADAM, Karl. A Essência do Catolicismo, pp. 166-167.

[3] GAUDRON, Padre Matthias. Catecismo Católico da Crise na Igreja, p. 122.

[4] ADAM, Karl. A Essência do Catolicismo, pp. 159.

[5] ADAM, Karl. A Essência do Catolicismo, pp. 163.

[6] GAUDRON, Padre Matthias. Catecismo Católico da Crise na Igreja, p. 120.


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